segunda-feira, 21 de maio de 2018

Uma História de Sucesso



Cada um tem sua história, e a minha é mais ou menos assim: meu pai sempre sustentou nossa casa sozinho, para que minha mãe pudesse cuidar dos filhos (tarefa que ela cumpriu BRILHANTE E IMPECAVELMENTE). Quando eu tinha 9 anos, meu pai me disse que me matricularia no concurso para o Colégio Militar. Eu ainda não sabia ao certo o que era o Colégio Militar (acho que o nome, de início, me deu até um pouco de medo), mas resolvi encarar o desafio.
Acordava sozinha às 5:30 e estudava em livros e apostilas específicos para o concurso. Às 6:00 eu ia para a cozinha fazer café para mim e para meu pai e, logo depois, ele me deixava no curso preparatório do professor Helvécio, aos cuidados da minha querida e inesquecível Gigi.
Eu ia estudando com afinco, até que um episódio me marcou de vez e me deixou decidida a passar. Foi quando ouvi meu pai conversando com minha mãe na cozinha: "Já pensou? Se a Silvinha passar para o Colégio Militar, não precisaremos pagar colégio para ela até a faculdade...". Meu pai nunca me pressionou, mas pensar na possibilidade da minha educação deixar de ser um gasto na casa me impulsionou mais ainda (afinal, éramos três filhos e filho custa caro!). A partir daquele dia, tudo mudou. Meus estudos ficaram mais sérios e, sempre que o cansaço batia, eu pensava na possibilidade do meu pai não precisar pagar 7 anos de colégio para mim. Eu tinha 9 anos de idade quando aceitei esse desafio.
E me lembro como se fosse hoje da data do resultado do concurso. Fomos ao Colégio eu, meu pai e minha mãe, ver uma listagem que estava anexada na parede de um pilotis. Meu pai gritava feito louco... "ELA PASSOU!!!! ELA PASSOU!!!!". Foi a minha primeira grande vitória e, poucas semanas depois, minha vida mudaria para sempre.
Veio a adaptação, a escolha do nome de guerra, a compra daquele uniforme do qual eu tanto me orgulhava, lanches e papo pro ar na Vó Dica (joelho, vitamina de morango ao leite, banana com aveia, quem se lembra?), as duras palavras do Capitão Reginaldo, ao mesmo tempo que escondia tanta doçura em seu olhar e tanto amor por seu trabalho. Cel Godoy, o ser onipresente, que não deixava o aluno sair da linha nem por um segundo! Inspeção de uniforme diariamente, nos ensinando desde cedo que uma boa apresentação é indispensável. Eles nos preparavam para a vida, e mal sabíamos disso naquela época...
Fiz ginástica olímpica, esgrima, natação, futebol, equitação. Vieram os melhores amigos do mundo, as melhores risadas e, juntos com eles, o senso de respeito pelo mais velho, senso de hierarquia, respeito ao professor (nos levantávamos a cada entrada e saída de professor da sala de aula) e ao patrimônio (ao final do dia os próprios alunos varriam as salas de aula). Meu caráter foi moldado nessa escola de uma maneira que nenhum outro colégio seria capaz de fazer. Um aluno do Colégio Militar sentado no ônibus enquanto um idoso estivesse em pé? Se algum oficial visse, era punição na certa. Não havia espaço para falta de educação, para falta de cidadania e de solidariedade.
Veio a época da Cavalaria, tardes e tardes cuidando dos nossos queridos amigos equinos, montando, dando banho, escovando, dando cenoura, gelatina em pó... NK, Ypê, Merlim, Maran, Guarani, Zatha, Mestre, Mosca, Feiticeira, dentre outros queridos. Alguns já se foram, mas todos continuam nos nossos corações. Fiéis companheiros de treinos e competições.
Não, o Colégio Militar não é repressor, como muitos desinformados pensam. O Colégio Militar é um verdadeiro formador de caráter. Daqueles que fazem MUITA falta hoje em dia.
Fui rockeira, revoltada, lutei contra o sistema, bati o pé, fiquei punida e decidi não seguir carreira militar. Não era pra mim. Mas enquanto estudei no CM, aprendi a conviver com o "não" e até mesmo com algumas injustiças, as quais eu não podia mudar. Aprendi a conviver com a frustração, e me dei conta de que o seu dinheiro ou o seu sobrenome não falam mais alto naquela instituição. A regra vale para todos, independente de quem você seja.
Falando em dinheiro, o CM tem um aspecto muito interessante: o uso de uniforme. Mas não é uma camisetinha e uma calça jeans. É um uniforme de verdade, que não dá espaço pra calça da moda, pro tênis mais caro, ou pra bolsa de marca. Mochila preta e lisa, sapato padronizado, vetado uso de cordões e de brincos que ultrapassassem o lóbulo da orelha. No CM não sabíamos quem era rico ou quem era pobre. Nossas amizades eram formadas única e exclusivamente por afinidade.
E hoje, dia 06 de maio de 2014, o Colégio Militar completa 125 de uma brilhante existência. Apesar de toda pressão que existe no sentido de flexibilizar a educação, o Colégio Militar se mantem íntegro em sua essência e consegue, na contramão do novo sistema de educação, ainda plantar no coração de cada aluno tudo aquilo que descrevi ali em cima.
Meus sete anos dentro dessa casa foram inesquecíveis. E eu só tenho a agradecer aos meus pais por terem me incentivado a batalhar por isso. Vocês não imaginam o quanto foi importante para mim.
Agradeço aos meus queridos professores, que nos transmitiam autoridade e muito carinho ao mesmo tempo. Maria Celeste Castro Machado, Maria Elvira Oliveira, dentre outros queridos.
Agradeço aos pais dos meus amigos Eduardo Blanco, Felipe Coutinho, Frederico (Ester Horácio Teixeira), Antônio Luiz C Doneda, Raquel Andrade (Eliana De Andrade), Wallace Wu, Renan Brandao (Sonia Essucy Brandão), Nathalia Saad dentre outros: vocês foram meus segundos pais e mães, e muito contribuíram para a minha formação de caráter.
Agradeço a todos os meus amigos. Os marcados e os que eventualmente não estejam marcados nessa postagem. Graças a Deus são MUITOS amigos que continuam presentes na minha vida até hoje.
Por fim, peço perdão pelos eventuais erros de português. Fiz o máximo que minhas lágrimas de saudades me permitiram fazer. Mas... hoje é o dia de chorar de saudade e de me orgulhar da minha trajetória até aqui.
"Mas um dia o pranto há de nossos olhos inundar, ao chorarmos a saudade DO COLÉGIO MILITAR!"
ZUM ZARAVALHO!!!

Texto de Silvia Leal

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